Natal é o período em que os cristãos obrigam-se a pertencer a uma família unida, alegre e feliz. A mídia, as redes sociais e a propaganda onipresente transmitem a ideia de que somente as famílias “perfeitas” celebram o Natal, o que pode elevar ainda mais a tristeza de quem se sente deslocado. Apesar das férias e dos recessos (e dos excessos), muita gente não percebe nem no coração nem na pele o chamado “espírito de natal” e por isso experimentam uma depressão circunstancial. Esse mal-estar tem nome: Christmas Blues (melancolia natalina).
SINTOMAS
Os sintomas são tristeza, nostalgia de um passado distante, desânimo, ansiedade, apatia, insônia, fadiga física e mental. Dois tipos de pessoas têm de lidar com essa melancolia (imposta por regras sociais) nessa época do ano: 1) as pessoas que se sentem sozinhas mesmo não estando; e 2) as que estão realmente sozinhas (por opção ou por falta de).
A hiperatividade inerente às compras, à preparação das ceias e aos reencontros (muitas vezes obrigatórios) com parentes ajudam a aumentar ainda mais a ansiedade, o estresse e pensamentos negativos. “A Melancolia do Natal também afeta aqueles que estão aparentemente integrados e serenos”, diz a psicoterapeuta Agnese Rossi, do Hospital Humanitas, de Bergamo, Itália. Ela separa também a solidão em dois tipos:
TIPOS DE SOLIDÃO
1) A solidão sofrida – que se dá pela falta/ausência de alguém – faz aumentar o medo dos próprios limites e das possíveis consequências da abertura ao outro. Se por um lado parece ter um sentido protetor, na realidade nos isola do mundo, favorecendo uma realidade falsa, desprovida de conflitos e aparentemente linear e previsível. “Uma realidade no entanto ‘não humana’, porque suprime a sociabilidade.”
2) A solidão desejada, ao contrário, espelha uma vontade profunda de estar consigo mesmo, de ouvir-se e de entrar em contato com a própria intimidade, com o seu mundo interior. Pode fazer fluir pensamentos, fantasias, emoções, criatividades. “A gente entra em contato com a nossa singularidade e complexidade. Aprendemos (ou não) a ficar sozinhos; aprendemos (ou não) a amar o nosso modo de ser e de sentir.”
VAZIOS
Quem discordaria do fato de que vivemos em um mundo em que a solidão é tão malvista quanto temida? Usamos muitos estratagemas para nunca ficarmos sozinhos: música ensurdecedora em lojas, salas de espera, restaurantes e transportes públicos; rádio e TV ligados em casa o tempo todo, mesmo quando não estamos prestando atenção, para nos “fazer companhia”. Na realidade, por medo do silêncio, do vazio à nossa volta e dentro de nós, procuramos nos preencher de algum modo.
Tendemos a querer ocupar todos os espaços, até mesmo o espaço interno, íntimo, com sons e com objetos, aumentando o risco de não encontrarmos um momento adequado para poder, por exemplo, ler, refletir, contemplar ou mesmo conversar. “Computadores e celulares nos permitem entrar em um mundo feito de conexões ilimitadas, mas todas virtuais. Os contatos mais saudáveis, no entanto, são aqueles que englobam toda a nossa corporeidade e emotividade.”
RISCOS
Se não posso olhar o interlocutor nos olhos, apertar-lhe a mão ou escutar a sua voz, como poderei encontrá-lo(a) realmente?, questiona Rossi. A nossa saúde física e mental se ressente da solidão sofrida (não buscada), quando experimentada longamente. Todo mundo sabe que sedentarismo, má alimentação, obesidade e cigarros causam doenças crônicas. Mas nem todo mundo está ciente do poder negativo das experiências emocionais decorrentes da solidão.
“Essas experiências negativas deveriam estar entre os fatores de risco de muitas doenças cardiovasculares, por exemplo. O cortisol, ‘hormônio do estresse’, aumenta quando a solidão parece um fator imutável; e compromete o sistema imunológico e a cognição. Além disso, a solidão ajuda a deflagrar depressão e ansiedade. Um bem-estar em 360 graus passa não só por alimentação e atividade física saudável, mas também pelo cuidado com o lado psicológico.”
SIMBOLOGIAS
Como espelho da família (e da dinâmica familiar), o Natal é uma festa sobrecarregada de simbologias. Isso pode ser fonte tanto de alegria quanto de dor, dependendo de como essa data foi vivida ao longo dos anos. Entre os fatores que podem desencadear crises reais durante esse período estão: os agrupamentos familiares forçados; as DRs (discussões sobre os relacionamentos mal resolvidos); as obrigações morais e a ausência de pessoas falecidas.
Adriano Formoso, psicólogo e psicoterapeuta milanês, explica o que as pessoas alérgicas ao Natal devem fazer para evitar o nervosismo e a irritação. A receita para sobreviver às situações estressantes do Natal, segundo ele, é adotar uma atitude sóbria e tolerar: “Você deveria perguntar a si mesmo como o seu sentimento de inadequação com o Natal começou ou se desenvolveu; e aceitar as diferenças. Aceitar, principalmente, quem curte verdadeiramente esse período do ano”.
Segundo Formoso, não é o caso de desconsiderar a fuga como solução: “Se você realmente não consegue, se você sente o Natal como algo muito desagradável, que traz de volta uma memória amarga, uma atmosfera tensa, procure evitá-lo. Alternativamente, organize uma viagem, tente passar a noite entre amigos ou em uma associação de voluntários. O Natal deveria ser uma simples extensão do resto do ano, não o único momento de encontro do ano.”
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Olá professor! Ótimo texto. Eu já gostei do Natal, mas esse sentimento foi se perdendo. Os lugares todos cheios, a obrigação de comprar presentes (mesmo sem inspiração ou sem dinheiro), a casa, na noite de Natal, lotada de gente falando alto assuntos que não te interessam…. enfim, muitos motivos. O problema é fazer a família aceitar que vc só quer ficar em casa sozinha, de boa, vendo um filme e comendo sua própria e simples comida. A mãe vai fazer drama, cara feia e até chantagem. Enfim, esta é pra mim, antes de tudo, época de estresse e de obrigações sociais.