Trinta anos se passaram desde o lançamento do livro “Inteligência Emocional” (1995), de Daniel Goleman, que popularizou o conceito. Apesar da ampla difusão, poucas pessoas sabem responder à pergunta “como você está se sentindo?”. Pesquisas indicam que responder com exatidão a essa pergunta-chave e ser capaz de lidar com as próprias emoções melhora a saúde física e mental. Porém, em nossa cultura hipertecnológica acelerada e deletéria, incentiva-se a ignorância (não a competência) emocional. A mensagem implícita é: “Esconda teus sentimentos e emoções e não fale sobre isso”.

As emoções são aquilo que mexe com a gente de alguma forma. Como não podemos passar pela vida ignorando o que sentimos ou minimizando seu significado, quanto mais conhecimento tivermos sobre o que se passa dentro da gente, melhor (para todos). Mas não é fácil. Não nascemos capazes de interpretar e expressar sentimentos e emoções conscientemente. Temos que aprender a fazer isso. Você pode aprender empiricamente no dia a dia. Mas também pode assimilar técnicas que facilitam a identificação e o processamento das emoções.
DEFINIÇÕES
As emoções podem ser definidas como respostas orgânicas intensas (e de curta duração) a estímulos externos. Exemplos: você vê algo asqueroso e sente nojo. Teu chefe te dá uma bronca e você fica com raiva por ter sido repreendido injustamente. Ou com medo de perder o emprego. Pode ter dor de barriga antes da reunião em que fará a apresentação de um projeto. Ou ser vítima de uma grosseria absurda que azeda o teu dia. Enfim, ficar vermelho feito um tomate, chorar de alegria, rolar de rir e arrepiar os cabelos são emoções sendo expressas em alto grau.
Emoções e sentimentos estão sempre interligados, mas são fenômenos distintos. Sentimentos são processos mentais de autoavaliação geralmente duradouros. Os sentimentos são acessíveis apenas à própria pessoa, enquanto as nossas emoções podem ser observadas pelos outros, quando as expressamos em palavras ou em linguagem não verbal (por gestos, por exemplo). A emoção te dá a informação sobre como você está (preocupado, relaxado, constrangido, etc.); e os sentimentos envolvidos nisso te ajudam a interpretar a informação principal – a emoção.
CIÊNCIA DO AFETO
Fomos educados para reprimir, ignorar, demonizar, evitar e esconder emoções e sentimentos. A crença de que elas prejudicam o juízo é recorrente, embora a ciência tenha demonstrado que elas são parte indissociável dos processos decisórios. “Agora sabemos que não é possível tomar decisões ou mesmo pensar sem sermos influenciados pelas emoções. Nas sociedades modernas – tão diferentes do ambiente em que evoluímos como espécie – o mais comum é as emoções nos levarem na direção certa”, afirma Leonard Mlodinow em “Emocional: a Nova Neurociência dos Afetos”.
As emoções influenciam diversos âmbitos do cotidiano. O primeiro âmbito é o da memória: o que lembramos, o que aprendemos e para onde direcionamos nossa atenção. Quando estamos nas garras de emoções fortes (como a tristeza e a raiva, mas também a alegria ou a euforia) percebemos o mundo de outra forma e isso distorce nossas intepretações. As relações sociais são outro âmbito que sofre grande influência emotiva. As emoções nos enviam sinais para nos aproximarmos ou nos afastarmos de pessoas, para aceitar alguém ou evitá-lo(a), para recompensar ou punir.

OUTROS ÂMBITOS
O físico é muito influenciado também. As emoções (positivas e negativas, fortes ou fracas) causam reações fisiológicas diferentes no corpo e no cérebro. Liberam substâncias poderosas que, por sua vez, afetam nosso bem-estar geral. Outro âmbito de influência tem a ver com criatividade e desempenho. “Para alcançar grandes objetivos ou ser bem-sucedido no trabalho, temos que usar as emoções como se elas fossem ferramentas. E elas são mesmo”, afirma Marc Brackett em seu livro “Permissão Para Sentir”.
Em 1990, os pesquisadores Peter Salovey e John D. Mayer definiram a inteligência emocional como “a capacidade de perceber com precisão, avaliar e expressar emoções; a capacidade de acessar e/ou gerar sentimentos quando eles facilitam o pensamento; a capacidade de compreender as emoções e o conhecimento emocional; e a capacidade de regular as emoções para promover o crescimento emocional e intelectual”.
Com implicações multidimensionais, é natural termos tanto desconforto e estranheza em tentar processar e controlar as emoções. Isso é válido para sentimentos positivos, mas se mostra especialmente verdadeiro em relação aos desagradáveis (melancolia, ressentimento, rejeição). Em minutos, seu estado emocional pode ser completamente diferente, dependendo do que você viu no telejornal ou do almoço em família do qual você participou. A vida emocional é uma montanha-russa. A tensão pode subir loucamente e despencar em seguida.
VOCABULÁRIO
O vocabulário para nomear sentimentos possui algumas centenas de palavras. O vocabulário para nomear emoções, por outro lado, é mais restrito. Sim, a linguagem é importante. Sem a linguagem (verbal e não verbal) as emoções caem no esquecimento inconsciente. Isso não é nada bom para nossa saúde. Temos uma linguagem sofisticada para descrever vinhos, por exemplo. “Rico em especiarias e toques minerais. Profundo, com aromais florais de amora. Sabores surpreendentes de damasco e alcaçuz ao fundo. Taninos intensos, mas refinados…”.
Por outro lado, em se tratando de emoções e de vida interior, a linguagem é geralmente pobre ou inexistente. Mas, sem um vocabulário rico e adequado, não podemos processar e expressar nossas emoções, o que nos impede também de colocá-las em perspectiva. Não se trata apenas de retórica. Sabemos pelas neurociências e suas pesquisas com imagens que “se somos capazes de nomeá-las, seremos capazes de domesticá-las”. Descrever bem uma emoção é uma forma de adquirir controle sobre ela. A pergunta-chave “como você está se sentindo?” exige respostas precisas (e úteis).
QUESTÃO DE EMPATIA
A linguagem legitima e valida as experiências. Se você associa uma palavra ao que está sentindo, a emoção que está por trás dos teus sentimentos adquire certa substância. A palavra fixa o estado mental específico da situação provocadora da emoção. Você pode até comparar o teu estado mental com outros estados mentais experimentados no passado ou mesmo com os que você percebeu em outras pessoas. Ao fazermos isso, nossas emoções se transformam em um meio de comunicação, um canal de compartilhamento de experiências (questão de empatia, claro).
Exemplo: você não está preparado para tomar uma decisão, mas tem apenas três dias para tomá-la. A incerteza está afetando o teu funcionamento. Você se sente preocupado, distraído e ansioso. A palavra relacionada à tua situação poderia ser “pressão”. Sim, está sob pressão. Assumir isso não te fornece a decisão a tomar, mas torna a experiência aceitável e processável. Etiquetada a emoção (e os sentimentos envolvidos nela), você a entende melhor, amplia as chances de resolvê-la e pode inclusive compartilhá-la com alguém. O próximo passo? Mitigar as consequências da “pressão”.

NÃO SURTAR
Pesquisas variadas indicam que a autoconsciência sobre as emoções e os sentimentos (sinais) relacionados a elas nos devolve a capacidade de buscar/encontrar soluções para nossos problemas. Além disso, a gente passa a ter como controlar os efeitos colaterais de estarmos desconcentrados, irascíveis, vingativos ou rancorosos, por exemplo. No entanto, ser capaz de rotular e expressar emoções não significa surtar, berrar, despejar todos os impulsos nos outros ou se comportar como se não tivesse controle sobre o que sente. Na verdade, é o contrário disso.
Você não precisa expressar tuas emoções com outra pessoa, necessariamente. Pode fazê-lo com você mesmo(a), através de diálogos internos (ou por escrito). O processamento das emoções não tem impacto positivo apenas em nossa vida emocional interior. Muitas pesquisas demonstraram os benefícios físicos e mentais desse processamento. Redução da pressão arterial e do estresse. E uma melhora na função imunológica e no estado de ânimo de longo prazo, por exemplo. O fato é que devemos encarar as emoções como potenciais aliadas, não como nossas inimigas.