De 15% a 20% da população mundial, segundo especialistas, têm um temperamento específico denominado altamente sensível. Estamos falando de 1,4 bilhão de homens e mulheres cuja identificação é difícil. A maioria das pessoas altamente sensíveis passa a vida inteira “no armário”, tentando ser o que não é, tentando adaptar-se a um modo de viver e de sentir que não é o seu. Não por acaso é difícil assumir-se como sensível na cultura ocidental. Valorizamos a ação mais do que a reflexão, a razão mais do que a emoção, a força mais do que a delicadeza. Agora vejamos o que caracteriza as pessoas altamente sensíveis.
NÃO É DOENÇA
Ser altamente sensível não significa nem ser doente nem ser portador de uma síndrome ou transtorno. Não. Nada a ver. Estamos falando de um traço de temperamento com o qual se nasce (pesquisas recentes levam a crer que é algo inato, como veremos). Altamente sensíveis são os indivíduos que respondem de maneira muito profunda – em termos físicos, mentais e emocionais – aos estímulos externos (sociais/ambientais) e internos (as emoções que vêm de dentro e as dos outros). São pessoas com grande capacidade de:
- observar, ouvir e mostrar empatia;
- compreender os desejos e as necessidades dos outros;
- antever as possíveis consequências de uma decisão;
- interpretar os acontecimentos de maneira clara e convincente;
- emocionar-se ao contemplar a natureza;
- ficar horas ou dias em silêncio, apenas ouvindo música, por exemplo.
INTERPRETAÇÃO
“Não descobri nada de novo, na verdade”, diz Elaine N. Aron, autora de “Highly Sensitive Person”. “O fato é que esse tipo de temperamento sempre foi mal interpretado pelos profissionais da área de psicologia e psiquiatria. As pessoas altamente sensíveis preferem observar e refletir antes de se envolverem em situações novas. Por causa disso elas eram vistas como tímidas. Porém, a timidez é aprendida, não é inata. Muitos hipersensíveis também foram erroneamente rotulados como inibidos e neuróticos.”
A sensibilidade é valorizada de maneira diferente em diferentes culturas. Em culturas onde não é valorizada, as pessoas altamente sensíveis tendem a ter uma autoestima baixa. “Aprendem muito cedo que ser sensível é anormal”, sublinha Elaine Aron, pioneira nos estudos sobre o assunto e ela própria uma PAS. “O conjunto de características da alta sensibilidade é muito amplo. Nem todas as pessoas têm todas as características que compilei com base nas centenas de entrevistas que fiz e nos mapeamentos cerebrais que realizei com a ajuda de outros pesquisadores.” Vejamos as características gerais dos altamente sensíveis, segundo Aron.
CARACTERÍSTICAS (1)
- Têm uma vida interior rica e repleta de nuances;
- São muito afetadas intimamente por injustiças de modo geral;
- Percebem com clareza todas as sutilezas do ambiente onde estão;
- Sabem ler nas entrelinhas e escutam tanto o dito quanto o não dito;
- O humor das outras pessoas pode atingi-las em cheio e estragar-lhes o dia;
- Sentem com mais intensidade a dor, a fome e a sede;
- Depois de expostas a eventos sociais, precisam ficar sozinhas para recuperar as forças;
- Incomodam-se com luzes brilhantes, cheiros fortes e tecidos ásperos;
- Não toleram altos níveis de ruídos;
- Notam (e sabem desfrutar de) aromas, gostos e sons refinados;
- Comovem-se com música (e com ciência, filosofia e artes em geral);
- São conscienciosas e escrupulosas;
- Ficam tensas quando têm muito trabalho para ser feito em pouco tempo;
- Estressam-se mais facilmente que as outras pessoas;
CARACTERÍSTICAS (2)
- São perfeccionistas e estão sempre em busca de alguma forma de harmonia e consenso;
- Lutam para não cometer erros ou esquecer coisas;
- Tentam organizar a vida de modo a evitar situações perturbadoras;
- Rejeitam filmes e programas de TV violentos e/ou idiotas/banais;
- Ficam desorientadas com mudanças (não consentidas, não pactuadas);
- Muitos acontecimentos simultâneos lhes causam grande desconforto;
- Ficam nervosas quando têm de competir ou ser avaliadas;
- Dedicam bastante tempo ao autoconhecimento e ao autodesenvolvimento;
- Periodicamente, reelaboram a própria vida;
- Há fases em que exigem muito de si mesmas e outras nas quais não exigem nada;
- Intuitivas: sentem/percebem algo que ainda nem foi expressado;
- Sensatas: por consequência, boas conselheiras;
- Realizadoras e orientadas para a solução de problemas;
- Capazes de se concentrar profundamente em um projeto ou uma missão;
- Particularmente hábeis nas tarefas que exigem atenção, exatidão e velocidade;
- Têm facilidade em aprender idiomas;
- Conseguem facilmente pensar sobre o próprio pensar;
- Quando centradas, dialogam com extrema facilidade com quem quer que seja sobre assuntos os mais diversificados e complexos;
- Algumas pessoas altamente sensíveis são também introvertidas.
SUTILEZAS
“As pessoas altamente sensíveis prestam muita atenção às sutilezas da vida e sabem utilizar esse conhecimento para prever com sensatez e exatidão o que poderá acontecer. Essa habilidade pode ser vista como uma vantagem, às vezes”, afirma o psicólogo alemão Rolf Sellin, autor de “Pessoas Sensíveis Têm Uma Vantagem Extra”. “Porém, para transformar esse dom em benefício próprio, as pessoas altamente sensíveis têm de aprender a gerir/dosar suas percepções e estabelecer limites em seus relacionamentos”, escreve Sellin.
ASPECTOS NEGATIVOS
Vejamos alguns aspectos das pessoas altamente sensíveis que podem afetar negativamente a saúde, o bem-estar, o trabalho e os relacionamentos:
- Têm dificuldade em abandonar pensamentos e emoções negativos e de estabelecer os seus próprios espaços e limites;
- Por não perceberem os próprios limites, se superestimam (ou se subestimam) e muitas vezes não notam os sinais/avisos emitidos pelo corpo;
- Recebem mais estímulos e sofrem mais com as injustiças do mundo;
- Experimentam ansiedade com mais frequência que as outras pessoas;
- Sentem-se muito abaixo das suas próprias expectativas;
- Têm medo da rejeição, mesmo em situações irrelevantes;
- Comparam-se muito com os outros e acabam se sentindo mal por causa disso;
- Guardam ressentimentos quando ofendidas, maltratadas ou injustiçadas;
- Para obterem aprovação social, tentam ser “insensíveis” (inutilmente) ou “adaptadas” (até se darem conta de que passaram por cima de si mesmas).
- Carregam dentro de si desde a infância muitas experiências/emoções negativas;
- Sabem compreender os problemas dos outros e acabam se envolvendo muito;
- No geral, têm dificuldade em aceitar um feedback crítico, mesmo quando construtivo;
- Desconfiam dos (ou não levam a sério os) elogios recebidos;
- Produzem melhor sozinhas do que em grupo;
- Têm um medo irracional de serem (pre)julgadas.
- São influenciadas por notícias ruins veiculadas pela mídia.
- Evitam postar conteúdos pessoais nas redes sociais.
MENTE HIPERATIVA
“As pessoas altamente sensíveis possuem uma mente hiperativa, que parece não se desligar nunca. Seus cérebros são mais ramificados que os cérebros das demais pessoas, o que permite a ocorrência simultânea de um número muito maior de sinapses“, explica a psicoterapeuta francesa Christel Petitcollin, autora de “Je Pense Trop” [em italiano: “Il Potere Nascosto Degli Ipersensibili“; não traduzido para o português.]
Segundo Rolf Sellin, também ele uma PAS, estabelecer fronteiras (nos relacionamentos com os outros) e limites (no relacionamento consigo mesmo) é importante para os super sensíveis. Isso evita oscilações entre expectativas muito elevadas e expectativas muito baixas. “Além disso, há o corpo”, sublinha Sellin.
“O corpo expressa o que está acontecendo no tempo presente, fora da mente, e as pessoas altamente sensíveis precisam prestar atenção aos sinais que os seus corpos emitem. Esses sinais (dor, cansaço, desconforto, palpitação, etc.), quando bem decodificados, ajudam a encontrar o ponto de equilíbrio entre a apatia e a intensidade.”
ACEITAR-SE
Segundo os pesquisadores dessa área, o mais importante é a pessoa altamente sensível aceitar a sua própria natureza, em vez de ficar lutando contra o seu modo de ser. Tentar reproduzir o padrão das pessoas de sensibilidade “comum” pode ser pior. As pessoas com sensibilidade “comum” são esmagadora maioria e estão no comando das famílias, das instituições e dos governos. E você? É altamente sensível? Faça o teste (em inglês) aqui. Ah, lembre-se: hipersensibilidade pode ter alguma relação com introversão.
Oi Sérgio!
Que sensibilidade a sua escrever sobre PAS! Tenho, absolutamente, TODAS as características mencionadas por você. Justamente por isso, venho buscando explicações para tentar entender o que sinto e também como me comporto diante dos estímulos (bons ou não) do mundo. O fato é que, no meu entender, a literatura sobre o assunto ainda é insuficiente, ou talvez ainda não seja tão massificada, circulando, apenas, nos meios acadêmicos…não sei…
Então, Sérgio, penso que sua pauta é extremamente oportuna uma vez que o jeito de ser daqueles que são PAS precisa ser conhecido e compreendido por todos. Quem sabe o grupo das PAS começa a se entender melhor e os demais passam a tratar com mais delicadeza os que são mais sensíveis (tomara!).