Que tal sublinharmos algumas estratégias para um novo ciclo (ano)? A primeira é ser capaz de alterar as expectativas conforme o contexto. Às vezes é impossível se manter otimista diante do sensacionalismo transmitido pelas mídias profissionais e pelas mídias sociais. No entanto, a gente pode (gradualmente) começar a mudar o que realmente pode ser mudado: o funcionamento do nosso cérebro, tirando o máximo proveito de sua plasticidade.
MUDAR, MUDAR
O nosso modo de pensar e de agir pode mudar a realidade tanto objetiva quanto subjetiva. Temos a faculdade de criar, por exemplo, micro-profecias auto-realizáveis, mesmo que, à primeira vista, pareçam idiotices. É inegável: se a gente acorda pensando que vai ter um dia horrível é bem provável que estejamos nos preparando para – talvez seja melhor dizer “é bem provável que estejamos nos dizendo que queremos” – um dia horrível.
Na próxima vez que você se pegar fazendo uma previsão negativa para o seu futuro, não se culpe. Ao contrário: parabenize-se por estar pelo menos percebendo seu negativismo. As novas coisas que podemos esperar que aconteçam não precisam ser grandiosas. Meu primeiro gole de café pela manhã e a persistente audição dos “Noturnos” de Chopin enquanto ando de bicicleta ajudam a ampliar a perspectiva de outros eventos benéficos que possam me acontecer.
Não se trata de uma questão de crença. Tampouco estou falando de algo necessariamente racional. Ao que parece, acreditar não tem muito a ver com estatísticas ou projeções detalhadas. Por que acreditamos, então? Porque sim, simplesmente, mas também porque o “não” (o “não acreditar”) é uma opção destrutiva em todas as hipóteses, como têm mostrado os inúmeros estudos sobre como percebemos o nosso bem-estar. Ficou provado que o negativismo corrói pouco a pouco tanto o físico (o sistema imunitário) quanto o mental (a nossa capacidade de refletir e agir).
PENSAMENTOS
Nesse sentido, talvez seja importante evitar a sensação de que tudo, no fundo, no fundo é muito previsível. Ou seja, você vai acordar no primeiro dia de trabalho do ano novo e vai… Trabalhar! Indo mais além: dentro de algumas décadas o mundo – o Planeta Terra – estará coberto por uma espessa e onipresente cortina de fumaça escura que em última instância nos impedirá de enxergar um palmo diante do nosso nariz. No futuro será possível sobreviver sem máscaras?, me pergunto (risos). [Atenção: escrevi a frase anterior em dezembro de 2018. Em que ano estamos?]
Então, em vez de pensar nessas coisas, separe bem o lixo que da sua casa e encaminhe-o para o coletor apropriado. Se isso é obrigação da prefeitura ou do Papa, não importa. Faça-o. E quando você sentir que está atravessando um momento particularmente desafiador da sua vida e o pessimismo invadir a sua praia, evite oferecer muita resistência. A resistência frontal funciona bem se o Mal é indiscutivelmente Mal; senão, talvez seja mais inteligente identificar um sentimento negativo e minimizar o seu potencial destrutivo.
“TRAUMAS”
Por outro lado, se achar que seus “traumas” são a principal causa de seus infortúnios, a sua única opção será transformar esses tais “traumas” em pensamentos e atitudes mais claramente favoráveis a você. Mas… espere: não foi exatamente isso o que propus no parágrafo anterior? Sim!! Tudo gira em torno do mesmo movimento: você constrói a sua realidade, assim como eu construo a minha, conforme as circunstâncias. E que assim seja.
[Ultimamente, quando me sinto meio down, a primeira coisa que faço é remover da mente – com toda desfaçatez, aliás – a estrutura de pensamentos maléfica que me ronda. Afinal, de que me serviriam as ciências senão para eu poder agir em meu favor?]
UM TESTE
Permita-se um teste: na primeira semana do ano peça a alguém — um familiar, um(a) amigo(a) ou mesmo um estranho — para lhe contar um história sobre o sentido da vida. Ouça-a com as suas melhores intenções e permita que o seu eu profundo entre em contato com o sentido expressado pelo outro. Quando a gente ouve com atenção uma história sobre amor, sabedoria, compaixão, coragem, etc., o conteúdo da história dá uma iluminada no nosso cérebro assim como os relâmpagos iluminam as tempestades.
Sei que o desânimo pode ser pior quando se atinge algum sucesso, porque, nesse caso, a gente tende a querer mais e mais e por causa disso não prestamos atenção ao que já obtivemos de fato. Nunca estaremos 100% livres de tempestades, enchentes, furacões, tsunamis e tal. Nunca. Mas podemos estar conscientes de onde estamos; somos capazes de nos ver no lugar em que realmente estamos. E o mais interessante: com um pouco de imaginação podemos nos projetar em outros lugares, outras condições, enfim, podemos mentalizar (ou imaginar) um futuro para nós.
PERGUNTE-SE
Pergunte-se: “Pode haver coisa melhor do que estar aqui onde estou agora?”. Se sim, qual seria essa tal outra coisa melhor? Não sonhar ao acaso. Sonhar concretamente, não se esquecendo de que existem coisas neste mundo que amamos mais do que a nós mesmos. Pode ser um filho ou uma filha. Ou a arte em suas diversas formas; pode ser um deus ou uma deusa; pode ser a invenção da invenção da invenção; mas também pode ser simplesmente a aventura em si mesma, a força de locomover-se na direção do que parece tangível (sim, apenas parece, mas isso já é muito).
Claro, se você ficar preso às possíveis consequências do aquecimento global e dos conflitos armados, não poderá ver (ou não olhará nunca para) o céu. Você sabia que é exatamente do céu – por meio de drones – que chegam às zonas rurais de países pobres da África o sangue e o plasma que salvam vidas? As ideias que estão mudando o mundo surgem em todos os lugares, continuamente, e isso é animador. Ou seja, a inovação leva a mais inovação que leva a mais inovação. Não importa qual seja a inovação. Importa o uso que fazemos da inovação. Importa que através dela possamos melhorar a vida, a nossa e a dos outros.
LOCALIZE-SE
Localize-se no mundo à sua própria maneira, não à maneira ditada pelas mídias profissionais (organizações que se autodenominam “jornalísticas”) e pelas redes sociais. E tenha em mente que nenhum esforço de concentração em prol do seu corpo e do ecossistema onde você está inserido terá mais importância do que a consciência de morrer. A certeza da morte pode ser incrivelmente inspiradora se você deixar para trás aquelas ideias maniqueístas que fazem a vida parecer uma ação kamikaze do tipo oito-ou-oitenta. Calma. O isto e o aquilo até podem estar juntos, sem exclusões, quem sabe?
Um exemplo interessante disso é o projeto “Before I Die” (“Antes de Morrer”), da artista Candy Chang, que convida as pessoas a contemplar a morte e refletir sobre as suas próprias vidas. Criado em uma casa abandonada em Nova Orleans (EUA), após Chang ter perdido uma pessoa que amava muito, o projeto cresceu. Hoje existem 4 mil murais mundo afora com a frase “Antes de morrer eu quero…”. E as respostas das pessoas são surpreendentes. Algumas delas:
- “Antes de morrer eu quero… me perdoar”;
- “…plantar uma árvore”;
- “…encontrar beleza no processo de envelhecer”;
- “…dividir a minha salada com um alienígena”;
- “…descobrir quem eu sou”;
- “… aproveitar cada dia das mais diversas maneiras”;
- “…evaporar na luz”.
AQUI AGORA
Os painéis de Chang conectaram vizinhos e realçaram esperanças e sonhos. “Nesta era de distrações crescentes”, diz ela, “é mais importante do que nunca encontrar maneiras de cultivar perspectivas e relembrar que a vida é tão breve quanto terna. Preparar-se para a morte e assumir para si mesmo todas as coisas que você pode ter aqui e agora pode ser uma das coisas mais edificantes que podemos fazer dentro do pouco tempo de que dispomos”. E sabe o que quero fazer antes de morrer? Tudo o que estiver ao meu alcance para que eu me sinta bem e ativo.
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