Os imperativos que a gente mais ouviu na vida foram “você precisa aprender a esperar”, “tenha paciência” e “não seja impulsivo”. Saber esperar é uma virtude. Não por acaso, das Quatro Virtudes Cardinais, duas têm relação direta com a espera: a fortaleza (manter estáveis as nossas intenções ao longo do tempo); e a temperança (moderar-se nos apetites imediatos para evitar distrações).

Independentemente de ser uma virtude (em sentido moral), saber esperar faz bem à saúde, dizem os cientistas. Essa é uma boa notícia. Agora a má notícia: como a capacidade de esperar não vem escrita em nosso DNA, precisamos aprendê-la ao longo da vida. Três fatos que tento não esquecer em relação ao saber esperar:
- Exige paciência, mas também coragem e autoconfiança;
- É imprescindível para a realização de projetos de médio e de longo prazo;
- Durante uma espera sofreremos o assédio da frouxidão (melhor deixar para o ano que vem o início da dieta) e da gratificação fácil (comprar badulaques desnecessários e assim desfalcar a poupança para aquela tão sonhada viagem ao exterior).
DOIS PADRÕES
Quase todos os dias enfrentamos a situação de ter de escolher entre uma modesta recompensa para um desejo que podemos satisfazer hoje, agora, e a plena recompensa de um projeto cuja realização pode demandar anos. Nesse caso, entram em conflito dois padrões:
- A maximização numérica (muito é melhor que pouco);
- A minimização da espera (antes é melhor que depois).
Sem engajamento, porém, “muito” e “depois” significam nunca (risos). Saber esperar gera desconfortos e angústias também. O maior desconforto é a falta de garantia de que nossos objetivos de longo prazo terão (algum) sucesso. Já a angústia tem a ver com controlar as reações impulsivas aos eventos cotidianos desagradáveis. Em ambos os casos, a perseverança e a tolerância são as duas inspirações que deveriam nos guiar, acho.
QUANDO E COMO
Porém, perseverança e tolerância não são valores absolutos. Depende de quando e como, e não é fácil saber em qual caso o perseverar é a coisa mais sensata a fazer. A duras penas entendi que só vale a pena perseverar quando a recompensa futura é objetivamente melhor que a recompensa imediata (supondo que haja uma). Aprendi também que quando estou centrado, satisfeito comigo mesmo, lido melhor com os obstáculos e adversidades.
O fato é que sem a habilidade de esperar (e, por consequência, de perseverar) fica difícil atingir o que se quer. A palavra sucesso tem significados diferentes de pessoa para pessoa. Para mim, sucesso é ter o maior “controle” possível sobre as minhas escolhas e sobre o uso do meu tempo. Tomemos o sucesso aqui simplesmente como “atingir o objetivo desejado, qualquer que seja”.

NÃO EXAGERE
Em um mundo mutante como o nosso, para chegar ao sucesso, somos colocados diante do dilema “agora versus depois”. Uma pessoa guiada somente pela satisfação imediata pode ser presa fácil para a publicidade e o marketing (exemplo: troca logo o celular “velho” pelo último que saiu. Quem age assim, impulsivamente, pode perder de vista objetivos de longo prazo. Comprar uma casa, por exemplo.
Aceitar que nossos esforços e sacrifícios só darão frutos em um futuro distante e incerto é duríssimo. A sociedade do espetáculo (hummm, essas expressões antiquadas) tenta nos fazer acreditar que basta uma dose cavalar de determinação para chegarmos “lá”. No fundo, o que essa mesma sociedade está nos dizendo é o seguinte: “Esforce-se ao máximo, sim, mas não exagere, porque só os ‘geniais’ e/ou os ‘especiais’ chegam lá”. E esse “lá”, o que significa, para você?
LIMITAÇÕES
Filósofos e psicólogos afirmam que uma resistência estoica às tentações do agora por si só é insuficiente para levarmos adiante projetos um pouco mais complexos; e que o importante é a gente se conscientizar das nossas próprias limitações e se preparar para superá-las. [Concordo que o uso abusivo do substantivo ‘superação’ no sentido de “vejam este indivíduo, oh, ele/ela é um verdadeiro exemplo de superação” é um saco.]
Resumindo: em algum momento a gente vai ter que alterar nosso padrão de atitude. Você não precisa ser psicólogo ou filósofo para entender esse intricado confronto entre as dimensões de seus desejos de curto e longo prazo e as suas chances reais de realizá-los ou satisfazê-los. Até um simples escritor como eu é capaz de identificar e entender isso. Por que diabos a gente tem tanta dificuldade de esperar?
Biologicamente, a espécie memorizou que quanto menos se espera, menos riscos corre, e quem corre menos riscos vive mais, e quem vive mais tem mais chances de se reproduzir e transmitir seu patrimônio genético. A propensão a preferir as recompensas imediatas às futuras continua bem instalada em nossa psique. A cultura também influi muito. Minha impaciência com os pequenos obstáculos não são inatas. Eu as adquiri.

MEU MAIOR DEFEITO
A impaciência ainda é o meu maior defeito. Essa afirmação é controversa. Renunciei várias vezes ao conforto para experimentar a persistência e a constância; valorizei mais a minha liberdade de movimento e menos as finanças (sou um anticonsumista convicto); recusei poderes que pareciam irrecusáveis; sacrifiquei a tranquilidade em função de desafios novos.
Dito de outra forma: sou perseverante, e a perseverança é irmã da paciência. No cotidiano, porém, sou alvo fácil. Me torram a paciência: lentidões; barulheiras; supermercado lotado; dores lombares; atrasos; filas; egos imensuráveis; reuniões inúteis; cobranças (por que não veio?, por que não ligou?); cinismos…
Apesar dos esforços, ainda me flagro acelerado demais e com dificuldade de me ajustar ao fluxo das experiências do presente (pensamentos anos-luz à frente do corpo e da fala). Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA)? Talvez. Porém, escrevi livros e concluí mestrado e doutorado, e essas tarefas não foram difíceis para mim, felizmente.