Pesquisadores de diversas áreas têm demonstrado que a autoajuda positivista (baseada na Psicologia Positiva) não é séria. Há evidências, por exemplo, de que visualizar o sucesso não aumentará tuas chances de atingi-lo. Oliver Burkeman, autor de “Manual de Antiautoajuda”, argumenta que deveríamos “aceitar que nossos esforços para eliminar tudo o que é negativo – insegurança, incerteza, fracasso e tristeza – é precisamente o que nos faz inseguros, ansiosos, indecisos e infelizes”.

Quando mais você pensar que está bem (contra todas as evidências em contrário), mais você se sentirá mal. É o oposto do que prega a autoajuda tola. Por outro lado, há atitudes mais sensatas do ponto de vista prático do que apostar em uma positividade mágica. Por exemplo, apreciar a incerteza. Abraçar a insegurança. Parar de tentar ver o lado positivo de tudo. Enfrentar as emoções negativas, como tristeza, ansiedade, culpa e vergonha. Aceitar os fracassos. E aprender a valorizar a morte (até para sermos mais gratos pelo que possuímos hoje).
ARTHUR SCHOPENHAUER
Uma referência clássica sobre felicidade é o filósofo Arthur Schopenhauer (1788-1860). Ele é o autor de “A Arte de Ser Feliz”, publicado postumamente, no qual compila 50 máximas. Segundo o filósofo, a verdadeira felicidade é inatingível. Porque as alegrias e os prazeres são sempre ilusórios e efêmeros, enquanto a dor é real e presente. E porque a vida humana oscila entre o sofrimento e o tédio. Qualquer pessoa que busque a felicidade inevitavelmente encontrará decepção e frustração, afirma.
Em vez disso, é preciso moderar as próprias exigências para evitar a dor. “Viver feliz somente pode ter o sentido de viver da maneira menos infeliz possível, ou de uma maneira suportável”. Mas o livro que mais encantou os adeptos do positivismo mágico foi “O Segredo”. Sucesso mundial (livro e filme), “O Segredo” diz que tudo está ao alcance. Os palestrantes e gurus de autoajuda não perderam tempo em recomendá-lo. “E o pensamento positivo tornou-se ele próprio um negócio”, escreve Oliver Burkeman.
ABORDAGENS POPULARES
As abordagens mais populares da autoajuda são as mais discutíveis. Algumas se baseiam em “imaginações positivas” (imagine que as coisas vão dar certo e elas darão certo); e em ideias New Age como a “lei da atração” (pensamentos positivos atraem/geram positividades). Porém, ainda não há evidências científicas de que nossos pensamentos possam alterar acontecimentos que estão ocorrendo fora das nossas cabeças.

Em “Manual de antiautoajuda”, Oliver Burkeman fez uma análise metódica do culto ao otimismo irrestrito. Revisitou filósofos estoicos, budistas, consultores obcecados por metas e pensadores que duvidam de que meditar pode ajudar a solucionar problemas coletivos como o desemprego e a crise ambiental. Os estoicos argumentavam que só o ser humano recebeu da natureza o dom do raciocínio; e que o estado mental ideal é a tranquilidade (a “paz de espírito”). Isso é o oposto da motivação risonha difundida pelo positivismo oba-oba.
FILOSOFIA ESTOICA
Para os estoicos, a única coisa que podemos controlar são os nossos juízos a respeito do mundo, não o mundo em si. Os budistas acham que a raiz de todos os sofrimentos é o apego. O fato de desejarmos certas coisas, e de odiarmos ou não gostarmos de outras, é o que motiva a atividade humana. “No entanto, em vez de desfrutar de coisas prazerosas quando ocorrem e vivenciar o desprazer da dor, criamos o hábito do apego e da repulsa. A dor é inevitável, mas o sofrimento é resultado de nossos apegos”, pondera Burkeman.
A filosofia estoica é uma “filosofia antiautojuda”, em certo sentido. Ela enfatiza o autocontrole, o senso de dever, a dignidade e a disposição para aceitar (em vez de encontrar) a si mesmo. Os estoicos diziam para não nos prendermos demais aos confortos materiais e não nos viciarmos na nossa riqueza ou em qualquer bem material. Importante: os estoicos não demonizam essas coisas. Também diziam para não sermos psicologicamente escravizados pelas emoções. Em vez de deixar que as emoções nos manipulem, deveríamos assumir o controle delas.
ACEITAÇÃO E DOR
A aceitação é o cerne da abordagem estoica. Você pode diminuir a dor emocional se aceitar que o “pior” pode acontecer e se concentrar apenas no que é possível fazer para responder ao acontecimento. Parece claro que a melhor maneira de lidar com a adversidade é perceber e aceitar os pensamentos desagradáveis, não lutar contra eles ou contra os sentimentos que eles provocam. Mas nossa sociedade acelerada precisa de planos, objetivos e metas, componentes que nos fazem evitar a incerteza.
“A busca pela certeza bloqueia a busca pelo sentido. A incerteza é a própria condição que impele o ser humano a desenvolver seus poderes”, escreveu o psicólogo social Erich Fromm. “É na incerteza que as oportunidades estão à nossa espera”, acrescenta Burkeman. “A filosofia estoica diz que devemos assumir o comando da própria vida. Aprender a trabalhar nas coisas que estão ao nosso alcance para mudá-las. E não desperdiçar energia com algo que não você não pode mudar ou realizar”, escreve Leonardo Mlodinow no livro “Emocional”.

PROBLEMA E EQUAÇÃO
Os gurus da autoajuda, em vez de nos incentivarem a seguir o que a realidade parece ser, pedem que sigamos o que nós gostaríamos que ela fosse. Ou seja, incentivam práticas ilusórias, positivismos tão toscos quanto tóxicos. Este, aliás, é o problema central que este site tenta equacionar. No “Repensando Atitudes” a arte de se conhecer e de compreender nossos relacionamentos é vista de maneira ampla. Do individual para o social e vice-versa. Em contínuo intercâmbio.
Com frequência, precisamos da ajuda dos outros. Mas nada impede que a gente se autoajude. A filosofia estoica, como vimos, fornece diretrizes interessantes para isso, e mais realistas. Além disso, precisamos nos esforçar para estarmos o máximo de tempo possível no aqui-agora, não para ter sucesso amanhã, mas porque o aqui-agora nos acalma e nos dá força para encontrarmos soluções. Mesmo que você não possa pagar por uma psicoterapia, ainda assim pode ampliar teu autoconhecimento e ter saúde mental. O “Rep Ats” te ajuda nisso. Leia a 1ª parte deste artigo.